quarta-feira, 30 de setembro de 2020

Haemophilus influenzae

 Haemophilus influenzae


1- Morfologia e Estrutura 


Haemophilus são pequenos, às vezes pleomórficos, bacilos gram-negativos,  presentes nas membranas mucosas dos humanos, sendo o Haemophilus influenzae a espécie mais comumente associada com doença. Esse gênero possui em sua parede celular um lipossacarídeo com atividade de endotoxina, além de proteínas cepas-específicas e espécies-específicas, as quais são encontradas na membrana externa. A superfície da maioria das cepas de H. influenzae é recoberta com uma cápsula de polissacarídeo e seis sorótipos antigênicos (A-F) podem ser detectados. Além disso, a diferenciação sorológica de H. influenzae permitiu que a espécie fosse subdividida em oito biótipos (I a VIII), conforme observado em três reações bioquímicas: a produção de indol, a atividade da urease e atividade da ornitina descarboxilase.

Fonte: Google imagens.



2- Mecanismos de Patogenicidade 


  • Espécies de Haemophilus não encapsulada 

H. parainfluenzae e H. influenzae não encapsulados, são facilmente encontradas no trato respiratório superior nos primeiros meses de vida de quase todos os seres humanos. Esses seres podem se espalhar localmente causando algumas doenças tais como sinusite, nos seios da face, otite média, nos ouvidos, bronquite e pneumonia, no trato respiratório inferior. 

  • Espécies de Haemophilus encapsulada

H. influenzae encapsulado não é comum no trato respiratório superior, ou até mesmo, está presente em apenas pequenas quantidades. Mas se tratando de doenças, ela é uma causa muito comum em crianças não vacinadas, causando meningite e epiglotite - laringite obstrutiva. Pili e adeninas possibilitam a colonização da orofaringe por H. influenze. A bactéria apresenta várias estruturas em sua parede celular como, exemplo, lipopolissacarídeo e um glicopeptídeo de baixo peso molecular, comprometem a função ciliar, assim pode ser translocada através das células epiteliais e endoteliais e, possivelmente, entrar no sangue. Na ausência de anticorpos, especialmente os específicos contra a cápsula do polissacarídeo, uma bacteremia de alto grau pode acontecer e sua distribuição pelo corpo pode chegar nas meninges ou outros focos distais. 

  • Fatores de Virulência

H. influenze tipo b tem seu principal fator de virulência a cápsula possacarídica antifagocítica, na qual contém ribose, ribitol e fosfato (chamados de polirribitol fosfato [PRP]). Anticorpos que são dirigidos contra a cápsula estimulam a fagocitose bacteriana, em que são mediadas pela atividade bactericida do complemento. O desenvolvimento dos anticorpos se dá pela infeccção natural, vacinação com PRP purificado ou, até mesmo, transferência de anticorpos maternos de forma passiva. A gravidade de uma doença sistêmica se dá de forma inversa em relação com a eliminação das bactérias a partir do sangue. Os riscos de apresentação de meningite e epiglotite é muito maior em pessoas que não apresentam anticorpos anti-PRP, aos que não apresentam depleção do complemento e, também, aos que sofreram esplenectomia. Além disso, o componente do lipopolissacarídeo lipídio A induz inflamação em animais, por isso podem ser os responsáveis por dar início a resposta nos seres humanos. As proteases para a imunoglobulina IgA1 são produzidas pela H. influenzae, sejam elas encapsuladas ou não, podendo facilitar a colonização dos organismos em locais como mucosas, pois acabam interferindo a imunidade humoral.  



3- Cultura e diagnóstico laboratorial


  • Coleta de amostra

O diagnóstico laboratorial é feito a partir da coleta de amostras biológicas, como o sangue, secreções, fluido sinovial ou pleural, dentre outros, a depender da região afetada e das manifestações clínicas apresentadas. Exemplo: para o diagnóstico de pneumonia pode ser colhido escarro produzido nas vias aéreas inferiores, já para o diagnóstico de meningite, pode ser colhido sangue ou Líquido Cefalorraquidiano.


  • Cultura

A amostra pode ser cultivada no meio Ágar chocolate ou Ágar sangue. O Ágar chocolate é um meio rico e não seletivo, que permite o crescimento de várias bactérias. É composto por glóbulos vermelhos lisados, que liberam os fatores de crescimento X (hemina/hematina) e V (NAD - Dinucleotídeo de Nicotinamida e Adenina), que conferem a coloração marrom. Esse meio é feito com uma base e sangue de cavalo, carneiro ou coelho, aquecido suavemente para preservar os fatores. Já no meio Ágar sangue, o cultivo pode ser feito com Staphylococcus aureus, os quais fornecem fatores de crescimento (V e X) através da lise de eritrócitos, sem aquecimento, ocorrendo o fenômeno de satelitismo. A incubação dura cerca de 24 horas.

Fonte: KONEMAN et al

            Fonte: MURRAY


  • Identificação

O bacilo Gram-negativo pode ser identificado pela sua morfologia no exame microscópico do material corado, sendo essa detecção sensível e específica. Para identificar o subgrupo de H. influenzae  pode ser realizada uma biotipagem utilizando métodos sorológicos, como o teste de aglutinação de partículas (rápido e sensível), no qual partículas de látex revestidas com anticorpos são misturadas à amostra clínica, ocorrendo aglutinação se antígeno de membrana específico estiver presente (obs: é limitado à detecção de Influenzae tipo b). Além disso, testes bioquímicos ou análise de ácidos nucleicos podem ser utilizados para identificar outras espécies desse gênero.



4. Patogênese, Patologia e Tratamento


  •  Patogênese e patologia

A aderência e colonização do epitélio da nasofaringe é o primeiro passo para o desenvolvimento da infecção (subclínica) ou da doença sistêmica pelo Haemophilus influenzae, sobretudo pelo Hib ( Haemophilus influenzae tipo b) . A colonização pode persistir na nasofaringe durante meses e seu sucesso depende da cepa do Haemophilus influenzae e das defesas locais do hospedeiro.O H. influenzae, a partir da porta de entrada na nasofaringe, pode causar diversas manifestações clínicas localizadas e sistêmicas como faringite, sinusite, otite, laringite, pneumonia, meningite, septicemia, e outras possivelmente mais raras como: celulite, osteomielite e artrite. 


Fonte: MURRAY




Fonte: ALMEIDA et al


  • Meningite

H. influenzae tipo b foi a causa mais comum de meningite pediátrica, mas essa situação mudou rapidamente quando a vacina conjugada tornou‐se amplamente utilizada. Doença em pacientes não imunes resulta da disseminação bacterêmica de organismos da nasofaringe e não pode ser diferenciada clinicamente de outras causas de meningite bacteriana. A apresentação inicial é de 1 a 3 dias de história de doença respiratória

superior suave, depois da qual os sinais e sintomas característicos de meningite aparecem. 


  • Artrite

Antes do advento da vacina conjugada, a forma mais comum de artrite em crianças menores de 2 anos era infecção de uma única e grande articulação, secundária à disseminação bacterêmica por H. influenzae tipo b. A doença ocorre em crianças mais velhas e adultos, mas é muito incomum e, em geral, afeta pacientes imunocomprometidos com articulações previamente danificadas.


  • Otite, Sinusite e Doenças do Trato Respiratório Inferior 

Cepas não encapsuladas de H. influenzae são agentes patogênicos oportunistas que causam infecções das vias aéreas superiores e inferiores. Pneumonia primária é incomum em crianças e adultos que têm a função pulmonar normal. Esses organismos comumente colonizam os pacientes que têm doença pulmonar crônica e, com frequência, estão associados com exacerbação de bronquite e franca pneumonia.


  • Cancróide

O cancro mole é uma doença sexualmente transmissível que é mais comumente diagnosticada em homens, presumivelmente porque as mulheres podem ter a doença assintomática ou inaparente. Cerca de 5 a 7 dias após a exposição, uma pápula delicada com base eritematosa desenvolve‐se na genitália ou na região perianal. Dentro de 2 dias a lesão ulcera e torna‐se dolorosa, e linfadenopatia inguinal está comumente presente. Outras causas de úlceras genitais, tais como a sífilis e o herpes simples, devem ser excluídas para confirmar o diagnóstico cancroide.


  • Tratamento

Pacientes com infecções sistêmicas provocadas por H. influenzae requerem terapia antimicrobiana rápida porque a taxa de mortalidade, em pacientes com meningite não tratada ou epiglotite, se aproxima de 100%. As infecções graves são tratadas com cefalosporinas de amplo espectro. Infecções menos graves, tais como sinusites e otites, podem ser tratadas com amoxicilina, uma cefalosporina ativa, azitromicina, doxiciclina ou fluoroquinolona. 



5- Prevenção e Educação em Saúde


A vacinação é a única forma de se prevenir contra a doença e sua eficácia é de 95% a 100%. O SUS oferece a vacina contra Hib de graça e deve ser tomada de acordo com o calendário vacinal: dois, quatro e seis meses de vida. Caso atrase a dose em relação ao calendário ou deixe de tomar uma dose, procure um atendimento de saúde e providencie a próxima dose assim que possível. Se uma criança com menos de 4 anos não tiver totalmente imunizada, ela deve ser vacinada. Além disso, hábitos de higiene devem ser praticados -principalmente quando em contato com recém nascidos- como lavar sempre as mãos, utilizar álcool em gel e, se possível, o uso de máscaras. 


Fonte: arquivo pessoal



6- Caso clínico


A.G.N. M., sexo masculino, 1 ano, lactente imunocompetente, adentrou no Hospital Regional Tarcisio Maia, com história de febre nos últimos 3 dias, apresentou pneumonia 3 meses antes da internação, estava com o calendário vacinal completo, temperatura corporal de  38,2ºC, pálido, enchimento capilar prolongado, irritabilidade alternada com letargia, sinais de irritação meníngea, frequência cardíaca 145bpm, PA e saturação de O2 normais, líquido cefalorraquidiano revelou 4.110 leucócitos/mm3 (83% de neutrófilos), proteinorraquia de 440mg/dL, glicorraquia <20mg/dL e lactato de 107mg/dL. Nas culturas de LCR e sangue houve crescimento de Hi, identificado como do tipo f por método de aglutinação com soros policlonais.


Questões de Estudo:

1- O diagnóstico é presuntivo ou confirmatório? Explique.

2- Como identificar, in vitro, o Haemophilus influenzae?

3- Explique os mecanismos patogênicos desse microrganismo.

4- Qual(is) a(s) principal(is) forma(s) de transmissão do Haemophilus influenzae?

5- Como prevenir contra esse microrganismo?

6- Quais as principais condições clínicas que esse patógeno pode causar?




REFERÊNCIAS

Murray P, Rosenthal KS, Pffaler MA. Microbiologia Médica. 7.ed. Rio de Janeiro: Elsevier Editora Ltda.;2010.

KONEMAN, E.W. et al. Diagnóstico Microbiológico.Texto e Atlas Colorido. 6ª. ed., Guanabara Koogan, 2008. 

Cardoso MP, Pasternak J, Giglio AE, Casagrande RRD, Troster EJ. Meningite por Haemophilus influenzae. Einstein (São Paulo) [Internet]. 2013; 11(4):521-523. Disponível em: https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1679-45082013000400020 

ALMEIDA AECC et al. Cepas de Haemophilus influenzae circulantes, antes e após a utilização da vacina contra o sorotipo b, e o contexto epidemiológico das doenças por Haemophilus no Brasil. 2005. Tese de Doutorado.


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