quarta-feira, 30 de setembro de 2020

Neisseria gonorrhoae

 Neisseria gonorrhoae 


1- Morfologia e Estrutura 

A Neisseria gonorrhoeae é uma bactéria aeróbica não flagelada, em forma de cocos e disposta em pares; essa forma se denomina diplococos. Apresenta 0,6 a 1,0 μm de diâmetro e têm seus lados adjacentes achatados. 

Fonte: Google Imagens


A N. gonorrhoeae é uma bactéria Gram-negativa, sendo assim, apresenta uma fina camada de peptidoglicano localizada entre a membrana citoplasmática e a membrana externa. Embora a superfície externa de N. gonorrhoeae não seja coberta com uma verdadeira cápsula de carboidratos, ela apresenta carga negativa como a cápsula. Outra característica dessa bactéria é a presença de pili que se estendem da membrana citoplasmática e atravessam a membrana externa. Esse Pili possui várias funções que  incluem aderência às células do hospedeiro, transferência de material genético e motilidade. Essas bactérias também são oxidase-positiva e produzem catalase. Ácidos são produzidos por oxidação de glicose.

2- Mecanismos de Patogenicidade 


  • Pili: São compostos por subunidades proteicas repetitivas (pilinas), as quais têm a expressão controlada pelo gene pil. Está associado aos mecanismos de patogenicidade, pois essa estrutura permite a adesão às células epiteliais não ciliadas, como o epitélio da vagina, tubas uterinas e mucosa oral, garantindo resistência a morte causada por neutrófilos. Além disso, as pilinas possuem uma região conservada na porção aminoterminal e outra variável na porção carboxiterminal, esta última, por sua vez, pode sofrer fosforilação, glicosilação e ser associada a uma segunda proteína (PilC), que contribui para a diversidade antigênica, causando uma ausência de imunidade pra a reinfecção por N. gonorrhoeae.


  • Proteínas porB (proteínas I): Garantem a sobrevivência da bactéria no meio intracelular dos neutrófilos, pois elas interferem na degranulação de neutrófilos, ou seja, a fusão do fagolisossoma ao lisossomo, que causaria a morte da bactéria.


  • Proteína Opa (proteínas II): São responsáveis por mediarem a aderência firme às células eucarióticas (epitélio e fagócitos). Ademais está associada à doenças clinicas, sendo conhecidas como proteínas de opacidade, devido à formação de colônias opacas em cultura (mais comum em pacientes com doenças localizadas - endocervivite, uretrite, faringite e prostatite). Podem também formar colônias transparentes (mais associadas À doenças disseminadas - doença inflamatória pélvica e artrite).


  • Proteínas Rmp (proteínas III): São proteínas modificadas por redução, que estimulam anticorpos bloqueadores, interferindo na atividade bactericida do soro. 


  • Proteínas de ligação à transferrina: Medeiam a aquisição de ferro para o metabolismo bacteriano por meio de competição com o hospedeiro, assim como as duas proteínas seguintes.


  • Proteínas de ligação à lactoferrina 


  • Proteínas de ligação à hemoglobina


  • Lipo-oligossacarídeo (LOS): É um antígeno composto pelo lipídio A e um núcleo de polissacarídeo. Essa molécula de lipídio A tem atividade de endotoxina, desencadeando uma resposta inflamatória, que ativa o sistema complemento e estimula liberação de fator de necrose tumoral-alfa (TNF-alfa).


  • IgA protease: Destroem a imunoglobulina A1


  • Beta-Lactamase: São capazes de degradar a penicilina

Fonte: Google imagens



3- Cultura e diagnóstico laboratorial 


  • Microscopia

A coloração de Gram é muito sensível (acima de 90%) e específica (98%) para a detecção de infecção gonocócica em homens com uretrite purulenta. Dessa maneira, a coloração de Gram pode ser utilizada com segurança para diagnosticar infecções em homens com uretrite purulenta e mulheres com cervicite, mas todos os resultados negativos em mulheres e em homens assintomáticos devem ser confirmados por cultura.


  • Detecção de Antígeno

Os testes para detecção de antígenos de N. gonorrhoeae são menos sensíveis que a cultura ou testes de amplificação de ácidos nucleicos, e não são recomendados, a menos que testes confirmatórios sejam realizados em espécimes negativos.


  • Testes Baseados em Ácidos Nucleicos

Testes de amplificação de ácido nucleico específicos para N. gonorrhoeae têm sido desenvolvidos para a detecção direta da bactéria em espécimes clínicos. Esses testes são sensíveis, específicos e rápidos (resultados disponíveis em uma a duas horas).


  • Cultura

N. gonorrhoeae pode ser facilmente isolada de espécimes genitais se forem tomados os cuidados adequados durante a coleta e o processamento do espécime. Já que outros organismos comensais normalmente colonizam superfícies mucosas, todos os espécimes genitais, retais e da faringe devem ser inoculados em meios não seletivos (p. ex., ágar‐chocolate) e meios seletivos (p. ex., meio Thayer‐Martin modificado) que inibem o crescimento de microrganismos contaminantes.


OBS: A cultura é sensível e específica, mas tem sido substituída por testes de amplificação de ácidos nucleicos em muitos laboratórios.



4- Patogênese, Patologia e Tratamento 


  • Patogênese: 

As doenças causadas por N. gonorrhoeae e N. meningitidis são bem conhecidas, enquanto outras espécies de Neisseria têm virulência limitada e geralmente causam apenas infecções oportunistas.

N. gonorrhoeae geralmente é transmitida por contato sexual. As mulheres têm 50% de chances de adquirir a infecção após um único contato com um homem infectado, enquanto para o homem o risco é de aproximadamente 20%. 

O principal reservatório do gonococo é a pessoa infectada e assintomática. Portadores assintomáticos são mais comuns entre mulheres que em homens. Geralmente, os sintomas desaparecem em poucas semanas em pessoas não tratadas e então se estabelece o estado de portador assintomático. 

O sítio da infecção também determina a ocorrência do estado de portador, sendo que infecções retais e faringianas são mais comumente associadas ao estado de portador do que as infecções genitais.


  • Patologias: 

  • Gonorreia: A infecção genital em homens é primariamente restrita à uretra. Após período de incubação de dois a cinco dias, ocorre um corrimento uretral purulento e disúria. Embora as complicações sejam raras, podem ocorrer epididimite, prostatite e abscesso periuretral. O sítio primário de infecção em mulheres é a cérvix (colo uterino), pois a bactéria infecta as células do epitélio colunar da endocérvix. O microrganismo não é capaz de infectar as células do epitélio escamoso da vagina de mulheres pós‑puberais. Pacientes sintomáticas geralmente apresentam corrimento vaginal, disúria e dor abdominal. Infecções genitais ascendentes, incluindo salpingites, abscessos tubo‑ovarianos e doença inflamatória pélvica são observadas em 10% a 20% das mulheres.


  • Fonte: MURRAY


  • Gonococcemia: Infecções disseminadas com septicemia e infecção da pele e articulações ocorrem em 1% a 3% das mulheres infectadas e em proporção muito menor nos homens infectados. A maior proporção de doença disseminada em mulheres é causada pelo grande número de infecções assintomáticas não tratadas nesta população. As manifestações clínicas de doenças disseminadas incluem febre, artralgia migratória, artrite supurativa nos punhos, joelhos e tornozelos e exantema pustular de base eritematosa sobre as extremidades, preservando a cabeça e o tronco. N. gonorrhoeae é a principal causa de artrite purulenta em adultos.



  • Fonte: MURRAY


  • Outras condições clínicas: peri‑hepatite (síndrome de Fi‑Hugh‑Curtis); conjuntivite purulenta, particularmente em recém‑nascidos infectados durante o parto vaginal (oftalmia neonatal); gonorreia anorretal em homens homossexuais; e faringite.


  • Fonte: MURRAY


  • Tratamento:

Infecções causadas por N. gonorrhoeae, especialmente a infecção sexualmente transmissível gonorreia, são conhecidas há séculos. Apesar da antibioticoterapia eficaz, a gonorreia é uma das doenças sexualmente transmitidas mais comuns em diversos países. A presença de N. gonorrhoeae em um material clínico sempre é considerada significativa. Desse modo, ao ter a sua presença perceptível, necessita-se que inicie o tratamento e dê continuidade a este de forma correta. Atualmente, o medicamento mais utilizado é a ceftriaxona, a qual será administrada em associação com a azitromicina ou com a doxiciclina,  que irá agir impedindo a ação de síntese da parede microbiana. Além disso, a utilização do aminociclitol (espectinomicina) pode ser realizada como uma forma de tratamento, visto que esse medicamento vai agir para inibir a síntese proteica desse microrganismo. Por fim, ressalta-se que ainda não existe disponibilidade de vacinas eficazes contra a N. gonorrhoeae.



5- Prevenção e Educação em Saúde 


  • A transmissão 

Pode ocorrer principalmente, de duas formas: por relações sexuais e por transmissão vertical (ou seja, da mãe para o bebê, principalmente durante o parto). 

  • Período de incubação

Pode ser medido cerca de até 24h após uma relação sexual desprotegida até 5 dias depois do ato. Por ser, em muitos casos, assintomática, pode permanecer durante anos no corpo da pessoa, caso ela não identifique e nem se trate adequadamente após o período de transmissão.

  • Prevenção

Fator crucial para que a infecção não seja transmitida para o(a) parceiro(a) e nem da mãe para o feto, visto que ela está baseada, sobretudo, na utilização de preservativos (sobretudo da camisinha) durante as relações sexuais, realizar o pré-natal de forma correta, procurar imediatamente o profissional médico caso tenha sintomas causados por esse microrganismo e, por fim, seguir o tratamento adequadamente para que ele seja eficaz.

 



6- Caso clínico 


I.F.S., sexo feminino, 25 anos, procurou o ambulatório de ginecologia da FACS, com queixas de dor ao urinar e corrimento vaginal branco e espesso, às vezes com presença de sangue. Relatou sentir dor na relação sexual há uma semana. Apresentava febre (38ºC). Foi observado eritema e corrimento em seu aparelho genital.


Questões de Estudo:

1- Qual o diagnóstico presuntivo e a conduta?

2- Quais exames laboratoriais podem confirmar o diagnóstico?

3- Quais são as medidas de prevenção dessa doença?

4- Por que não há vacina efetiva para esse tipo de bactéria?




REFERÊNCIAS:

Murray P, Rosenthal KS, Pffaler MA. Microbiologia Médica. 7.ed. Rio de Janeiro: Elsevier Editora Ltda.;2010.


Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS). A cada dia, há 1 milhão de novos casos de  infecções sexualmente transmissíveis curáveis [Internet]; 2019 Jun 6. Disponível em: https://www.paho.org/bra/index.php?option=com_content&view=article&id=5958:a-cada-dia-ha-1-milhao-de-novos-casos-de-infeccoes-sexualmente-transmissiveis-curaveis&Itemid=812


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