quinta-feira, 8 de outubro de 2020

Leptospira interrogans

1) Morfologia e Estrutura
    Leptospira interrogans é uma bactéria patogênica pertencente ao gênero Leptospira , da borda das eubactérias. Dentro desse limite, o gênero Leptospira é o único com representantes patogênicos capazes de causar infecções em mamíferos .
    As espécies do gênero são classificadas em alguns supergrupos e variedades de acordo com a expressão de um lipopolissacarídeo de superfície, cujas diferenças estruturais na região dos carboidratos determinam a diversidade antigênica dos sorovares.

    Como a maioria das leptospiras, o Leptospira interrogans é um espiroqueta móvel, de 6 a 20 μm de comprimento e 0,25 μm de largura, cujo corpo celular é enrolado helicoidalmente sobre si mesmo.
    Tem uma morfologia muito particular, na qual suas extremidades em forma de gancho dão a ela uma forma que alguns autores compararam com um ponto de interrogação.


Fonte: (Biblioteca de Imagens de Saúde Pública do CDC. [Domínio público])

    Eles compartilham características de superfície com bactérias Gram-positivas e Gram-negativas, por exemplo: Assim como as bactérias Gram-negativas, as leptospiras possuem lipopolissacarídeos e membranas duplas, enquanto compartilham com bactérias Gram-positivas a associação da membrana citoplasmática à parede celular da mureína.


    Eles são capazes de se mover graças à presença de dois flagelos modificados que são realmente conhecidos como filamentos axiais periplásmicos, que surgem em cada extremidade da bactéria e acredita-se que a mobilidade mediada por esses filamentos seja indispensável para a patogenicidade das espécies.

2) Mecanismo de Patogenicidade

    Estudos sugerem que as leptospiras utilizam a entrada na célula hospedeira e a rápida translocação sem dano ao tecido, como mecanismo para disseminarem aos órgãos alvos e evadir o sistema imune.

    As leptospiras apresentam múltiplas proteínas com função de ligação aos componentes da MEC, sugerindo que o processo de adesão seja de fato importante para a virulência das leptospiras e início da infecção e colonização.

    L. interrogans apresenta duas proteínas, LigA e LigB, expressas em todas as espécies patogênicas de leptospira, que tem sua expressão aumentada quando são expostas às concentrações de sal semelhantes aquelas encontradas no tecido dos hospedeiros, indicando um importante papel na patogênese da leptospirose. Possuem a capacidade de se aderirem a fibronectina, colágeno e laminina, estando possivelmente envolvidas na colonização dos tecidos nos hospedeiros, servindo como adesinas.

    A lipoproteína Loa22 é exposta na superfície bacteriana , reconhecida pelo soro de pacientes com leptospirose e possui maior expressão no modelo de infecção aguda.  

     Ao alcançar a corrente sanguínea, as leptospiras precisam superar o sistema imune do hospedeiro. Elas resistem à ação antibactericida do soro normal humano. Além disso, a invasão temporária de células permite não só que essas bactérias ultrapassem barreiras celulares, como também evita seu reconhecimento pelo sistema imunológico do hospedeiro. Tais patógenos também são capazes de sobreviver à ação de fagócitos (neutrófilos) e evadir o sistema complemento. 

     As leptospiras  utilizam enzimas proteolíticas para evadir o sistema imune do hospedeiro. É utilizado o sistema proteolítico plasminogênio/plasmina para invasão e evasão imune do hospedeiro. Elas são capazes de se ligarem ao plasminogênio (PLG) por meio de seus resíduos de lisina. O PLG ligado é convertido em plasmina, no entanto o ativador do hospedeiro é necessário para que essa conversão ocorra. A plasmina ativada é capaz de degradar imunoglobulinas e C3b, bem como fibronectina, contribuindo para as habilidades da leptospira de invadir e evadir.

     Proteases secretadas por leptospira clivam C3, C2, C4b e fator B inibindo as três vias do sistema complemento.

     A motilidade foi definida como essencial para a virulência da leptospira. O endoflagelo de espiroquetas possui uma estrutura complexa composta de proteínas FlaB, que constituem o cerne do endoflagelo, revestidas por proteínas FlaA.


3) Cultura e/ou Diagnóstico Laboratorial

        O diagnóstico da leptospirose ocorre por meio de exames laboratoriais específicos, tanto para pesquisar anticorpos contra a Leptospira interrogans no sangue do paciente com suspeita quanto a investigação direta desse patógeno em exame de cultura, no qual o material biológico é colocado em meios apropriados para o desenvolvimento da bactéria. Por serem delgadas, as leptospiras estão no limite de resolução do microscópio óptico, e não podem ser observadas por microscopia óptica convencional, sendo necessário o uso de microscopia de campo escuro e uma concentração mínima de 10.000 leptospiras/ml para que seja possível a visualização em microscópio.



Fonte: LEVETT; HAAKE, 2009 


O teste diagnóstico definitivo é a presença de leptospira em meios de cultura, sendo essa isolada do sangue, tecidos e LCR durante os primeiros 7 a 10 dias da doença e, a partir da segunda semana, na urina. A técnica empregada é muito laboriosa com baixa sensibilidade e os resultados demoram dias, pois as leptospiras patogênicas tem crescimento fastidioso, são muito exigentes e susceptíveis aos metabólitos produzidos por microrganismos contaminantes, dessa forma, precisam de meios de cultura especiais enriquecidos e técnicas de controle de contaminantes com o uso de agentes antimicrobianos. Necessitam de meio que contém fluidos orgânicos, ácidos graxos de cadeira longa, albumina bovina, complexos de polissorbato ou "tweens", entre outros. São exemplos dos meios de cultura utilizados para seu desenvolvimento: o EMJH, Fletcher ou o meio de Stuart.

        Em razão da necessidade de meios específicos e período de incubação longo, a maioria dos laboratórios não realizada cultura de leptospiras, dependendo de técnicas sorológicas. Um grande número de testes, como o teste de aglutinação microscópica (MAT), hemaglutinação indireta e ELISA, estão disponíveis. Dentre esses métodos, o MAT é considerado o padrão-ouro para o diagnóstico dessa doença, pois possuem grande sensibilidade e especificidade pela análise da capacidade do soro em aglutinar leptospiras vivas. Como o teste é dirigido contra sorótipos específicos, é necessário utilizar uma mistura de antígenos de leptospiras. Para sua realização, diluições seriadas do soro do paciente são misturadas com os antígenos, e uma análise microscópica é feita para aglutinação. Aglutininas aparecem no sangue de pacientes não tratados após 5 a 7 dias de infecção, embora essa resposta possa ser mais demorada (meses). Pacientes infectados apresentam título de pelo menos 1:200 (i.e., aglutininas são detectadas em uma diluição do soro de 1:200), podendo alcançar diluições de 1:25.000 ou maiores.



Fonte: Google Imagens

Testes baseados na técnica de Elisa vêm sendo amplamente aplicados, pois é um método muito sensível para detecção de anticorpos anti-leptospira, sendo o teste Elisa-IgM reconhecido pela OMS. O princípio da técnica consiste na imobilização de um dos reagentes (anticorpo ou antígeno) em uma fase sólida. Após a adição da amostra, o outro reagente ligado a enzima reagirá com o complexo antígeno-anticorpo. Com o acréscimo do substrato da enzima e do cromógeno, os imunocomplexos são revelados devido à formação de um produto colorido. Os resultados do teste de Elisa são expressos pelas absorbâncias obtidas de espectrofotômetros.


Ademais, a biologia molecular parece ser uma das melhores técnicas para detectar o agente em amostras do paciente, utilizando-se sangue, urina ou amostras de tecido. Pode ser utilizada como método diagnóstico no período inicial da doença, sendo uma técnica de alta sensibilidade e especificidade, embora tenha um custo mais elevado. O PCR pode amplificar, seletivamente, sequências alvos de DNA a partir de líquor e urina de pacientes com leptospirose.







4) Patogênese e Patologia
4.1 Patogênese

A L. interrogans utiliza da sua capacidade de invadir e translocar pelas células sem causar dano a tecidos para conseguir invadir o hospedeiro sem ativar uma resposta imune. A infecção causa uma prolongada leptospiremia até que o hospedeiro possa montar uma resposta imune efetiva, após a infecção, podem ocorrer uma doença aguda e eliminação do antígeno, ou o portador pode se tornar crônico. Para que se mantenha no hospedeiro, a L. interrogans habita a região dos tubos renais, onde há uma menor atuação do sistema imune. O início da doença está relacionado com a resposta humoral à infecção com o processo de lise celular. Os lipopolissacarídeos na membrana da leptospira ativam os receptores TLR2 nas células humanas, os peptídeoglicanos induzem a liberação do fator de necrose tumoral dos monócitos resultando em grandes danos aos tecidos infectados, e além disso determinadas proteínas de adesão da membrana são ativadas quando o antígeno entra em contato com concentrações salinas elevadas nos tecidos do hospedeiro, e a proteína de membrana LipL32 possui estrutura semelhante a colágenas. Mais estudos ainda são necessários quanto a patogênese da L. iterrogans.


4.2 Patologia

    A leptospirose é uma doença infecciosa e potencialmente grave, causada pela bactéria Leptospira interrogans. É considerada uma zoonose, entretanto essa infecção pode atingir também o homem. A transmissão ocorre, sobretudo, por meio do contato com a urina do rato. Inicialmente a infecção desenvolve manifestações discretas, ou não apresenta sintomas da doença. Os sintomas, quando ocorrem, em geral aparecem após o período de incubação de 1 a 2 semanas e em duas fases. A fase inicial é semelhante a uma gripe, com febre e dores musculares, que podem minimizar após uma semana ou pode progredir para a segunda fase, marcada por início súbito de cefaleia, mialgia, calafrios, náuseas, vômitos, cansaço, dor abdominal, hiperemia conjuntival e alguns podem apresentar tosse e faringite. O quadro mais grave da doença pode agravar-se para colapso vascular, trombocitopenias, hemorragia e disfunção hepática e renal. A forma mais grave da leptospirose é denominada doença de Weil que pode apresentar icterícia, manifestações hemorrágicas (equimoses, sangramento em nariz, gengivas e pulmões) e pode afetar os rins, o que causa diminuição do volume urinário e, às vezes, anúria total.



5) Tratamento

O tratamento da leptospirose é fundamentalmente com hidratação. Podem ser utilizados medicamentos sob prescrição médica como penicilina ou doxiciclinas administradas por via endovenosa. É importante ressaltar que não deve ser utilizado medicamentos para dor e febre que contenham ácido acetil-salicílico na sua fórmula, visto que podem aumentar o risco de sangramentos, além disso os anti-inflamatórios também não ser utilizados devido os efeitos colaterais, como hemorragias digestivas.



6) Prevenção e Educação em Saúde

A leptospirose é uma doença causada pela bactéria Leptospira e transmitida ao homem pela urina de roedores infectados, presente na água de córregos, rios e águas paradas ou no caso de enchentes.

A bactéria infecta dois hospedeiros: os reservatórios, que são os roedores, morcegos, onde se desenvolverá; e os incidentais, que podem ser humanos, cães, gatos e animais de fazenda.

Os meios primordiais de prevenção da doença são: não entrar em contato com a água de enchentes, lama ou esgotos; trabalhadores que realizam a limpeza das ruas sempre se proteger com luvas e botas; sempre que tiver contato com água possivelmente contaminada, realizar limpeza e desinfecção de mãos, pés e ambientes.

Logo, outro método eficiente de prevenção é manter a distância de animais roedores. Para isso é importante limpar terrenos baldios e margens de rios ou córregos; não jogar lixo em ambientes inadequados; manter cozinha e casa limpas, sem restos de alimentos que possam atraí-los; armazenar alimentos adequadamente; evitar acúmulo de materiais que sirvam de abrigo para roedores.

Além disso, é imprescindível a realização de obras de saneamento básico nas comunidades que ainda vivem em condições precárias, pois locais com esgoto a céu aberto e higiene urbana inadequada estão mais favoráveis a presença de animais roedores.

CASO CLÍNICO

    G.H.C., sexo masculino, 27 anos, pardo, proveniente de Nova Betânea, Mossoró-RN, deu entrada no H.R.T.M, queixando-se de  febre, dor de cabeça, dores pelo corpo, principalmente nas panturrilhas e diarreia, no exame físico também foi observado pequeno grau de icterícia devido aos olhos levemente amarelados. Um hemograma  foi realizado pelo paciente e entregue ao médico do hospital, que observou plaquetopenia, leucocitose, neutrofilia e desvio à esquerda. Dessa forma, foi solicitado um teste de ELISA-IgM reagente. e o teste de aglutinação microscópica. Os resultados deram positivo para presença da bactéria Leptospira interrogans, fechando o diagnóstico de Leptospirose.

Questões para estudo:
1. Quais os sintomas da Leptospira interrogans?
2. Como podemos diagnosticar a Leptospira interrogans? 3. Quais as características morfológicas da bactéria Leptospira interrogans? 4. Como podemos tratar a Leptospira interrogans?

REFERÊNCIAS

WUNDER JÚNIOR, Elsio Augusto et al. Patogênese da leptospirose: estudo sobre os fatores envolvidos na virulência e disseminação do agente durante a infecção no modelo animal de hamster. 2010. Tese de Doutorado. 

SIQUEIRA, Gabriela Hase. Envolvimento de proteínas de membrana de Leptospira interrogans nos mecanismos de evasão e invasão do hospedeiro. 2014. 264 f. Tese (Doutorado) - Curso de Biotecnologia, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2014.

MURRAY, Patrick R.; ROSENTHAL, Ken; PFALLER, Michael. Microbiologia medica 7 ed.

LEVETT, P. N; HAAKE, D. A. Leptospira Species (Leptospirosis). In: Gerald L. Mandell, John E. Bennett, Raphael Dolin (Ed.). Principles and pr actice of infectious diseases. Philadelphia: Elsevier, 2009, p.1-7.

AZEVÊDO, Diana de Oliveira Silva. Avaliação soro-epidemiológica da leptospirose canina de amostras coletadas em bairros residenciais de cruz das almas-ba, Brasil. 2016.

SILVEIRA, Thaís Brasil. Perfil de crescimento de genomoespécies de Leptospira spp. em diferentes meios de cultura. 2018.

MACEDO A, Sonia. Estudio Ultraestructural de Leptospira Biflexa Serovar Andamana cepa JNS al Microscopio Electrónico de Transmisión y Barrido. Rev. perú. med. exp. salud publica,  Lima ,  v. 22, n. 4, p. 281-289,  out.  2005.



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